não pretendo me livrar dos meus complexos
quero que floresçam.
estou apórica
poucos olhos para perceber que estou à beira
abismos cheios d'água
fomes vagam, confundem-se
com desejos injetados em mim
abocanho meu próprio caminho
não me alimento de qualquer coisa
se nos portões encontro grades
descubro que já tinha as chaves faz tempo
amiga é aquela que avisa quando
você já passou muito tempo dando cabeçadas
e também a que não permite que a outra
inicie também a cabecear
para não deixá-la só.
paciência às vezes
é um excesso de cuidado
um não-me-toque
algo a se segurar ali no inaudito
as dúvidas são vermelhas
daquele frio tão frio
que queima
e ali mesmo enquanto queima,
como um adesivo,
já adere à pele.
imagine deitar dentro de uma cápsula deste gelo
você curvada,
os joelhos como apoio para o queixo
e as canelas como os escudos pontudos do peito
e - ainda assim - completamente desprotegida.
imagine a sensação deste abraço.
vou driblando barrancos
dando voltas em imensidões
contornando buracos pé ante pé
contando distâncias no infinito
tudo em vão
e à beira do vão
nada tem um tamanho tão grande.
repita:
nada tem um tamanho tão grande
vazios são infinitos porque
habitam o ar
deslizam por baixo das coisas
o lugar mais cheio que houver
estará repleto também
do nada.
pra abocanhar o mundo é preciso saber
atrasar o onde
esquecer como
desfazer o que ainda não foi feito.