quinta-feira, 26 de maio de 2011

Cães.

Aquilo se tornara o nosso vício. Os urros, arranhões, beijos, a culpa, a dor. E o cheiro de sangue, o meu sangue, sempre preenchendo o ar. Me percorria com o ardor de um cão, como o animal que era. Arfava aos meus ouvidos, pingava de suor.

De luzes apagadas nada estava errado. Primeiro, a dor e as lágrimas. Depois, a culpa. Oras, não nos amávamos? O que há de errado em agir como amantes que éramos? Como os animais que éramos.

E ia, me preenchia, sem culpa, até que o meu sangue escorresse por sua barriga, até que eu implorasse pra parar. E levantava da cama, andava em círculos, não acendia as luzes. Não queria ver, nem lembrar. E me encontrar aos prantos era a maior prova do crime, do pecado. Como se não pudesse ouvir os soluços esganiçados que eu proferia através do escuro.

E cessavam-se os soluços, as lágrimas, ia-se o cheiro. Estávamos os dois sentados em lençóis sujos, no escuro. Silenciosamente.

Era sempre ele a quebrar o gelo, sua voz vinha sempre baixa, sibilante, pesada. Um cão rouco.


- Já está tarde. - sussurrava, no escuro, tateando em busca de uma das minhas mãos trêmulas. - Hora de ir, irmãzinha.

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